Semana de arrasar: derrota no Congresso, ministro demitido e laranjal
Quem não tiver a idade um pouco avançada não lembra. Lá pelos idos da década de 80 do século passado, a emissora de Silvio Santos apresentava um programa chamado "Semana do presidente". Ufanista, trazia coisas como isto aí de cima.
O atual presidente, Jair Bolsonaro, era um espectador assíduo nos horários de folga do quartel. O então tenente-paraquedista do Exército nem sonhava que um dia poderia ser o protagonista da série.
Mas se o programa ainda existisse o episódio de hoje não poderia ser produzido com um tom tão favorável. O atual presidente da República viveu nestes dias talvez o seu pior período deste início de governo.
Foi a semana seguinte ao retorno de uma internação de 17 dias no hospital Albert Einstein, em São Paulo, para retirada da bolsa de colostomia.
Não bastasse o mal-estar natural dos períodos pós-operatórios, ele caiu de paraquedas na crise envolvendo seu filho Carlos Bolsonaro e o ministro Gustavo Bebianno, secretário-geral da Presidência.
Bebianno presidiu o PSL durante a campanha eleitoral de Jair Bolsonaro. Acusado de ter lavado dinheiro de caixa 2 com candidaturas laranjas de mulheres, foi xingado de mentiroso pelo filho que o presidente chama de "meu pitbull".
A segunda-feira (18) foi marcada pela expectativa de demissão do ministro, só divulgada no final da tarde. Foi preciso uma longa negociação para tentar garantir que o ex-caixa de campanha não se torne um homem-bomba. Com direito ao um filmete do presidente cobrindo de elogios o novo desafeto:
Tudo bem, Bebianno ainda não se tornou –e talvez nunca se torne– um homem-bomba. Mas já na terça-feira (19) mostrou que há pavios de vários tipos que podem ser acionados. Deixou vazar gravações de mensagens de WhatsApp trocadas com o presidente. Os áudios desmentiam afirmação de Carlos "Pitbull" Bolsonaro de que o ex-ministro não conversara com o presidente.
Vale a pergunta: E se for um hábito de Jair Bolsonaro conversar por WhatsApps com as pessoas mais próximas? Será que Bebianno tem outras mensagens gravadas?
O pior dos áudios é que ainda revelaram um presidente grosseiro com seu subordinado e o nível de desentendimento entre o presidente da República e o grupo Globo de comunicação, além da relação de proximidade do Planalto com outras emissoras.
Aquela terça-feira foi realmente um dia de cão para o presidente.
Começou com a comissão de Fiscalização do Senado decidindo chamar Bebianno a depor. O ex-ministro irá repisar a crise com o filho do presidente que o Planalto quer ver esquecida. E ainda terá que explicar, gomo a gomo, como surgiram as laranjas da campanha eleitoral do PSL.
Também naquele dia os líderes de todos os partidos na Câmara prepararam, digamos, uma pequena facada pelas costas no presidente. Urdiram e conseguiram aprovar um projeto de decreto legislativo que derruba o decreto presidencial de ampliação do sigilo sobre informações do governo.
Nem Luciano Bivar (PE), atual presidente do partido de Bolsonaro, o PSL, votou com o governo.
Foi um recado ao Planalto de que a chamada base governista não existe. Se quiser aprovar o projeto de reforma da Previdência, Jair Bolsonaro terá que negociar com os caciques partidários. A começar pelos presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP).
A quarta-feira foi planejada pelo governo para ser um happening. O presidente da República foi pessoalmente ao Congresso levar a proposta de reforma da Previdência do ministro da Economia, Paulo Guedes, que tanto agrada aos agentes do mercado.
Essa entidade chamada mercado ficou satisfeita com o texto. Mas as críticas dos líderes do Congresso, especialmente dos aliados, a vários pontos do projeto acabaram funcionando como um banho de água fria. A proposta ainda será muito modificada ao passar pelo crivo dos parlamentares.
O Planalto resolveu ceder os anéis e anunciou uma concessão ao fisiologismo. Disse que fará um "banco de talentos" para preenchimento de cargos. Davi Alcolumbre foi direto ao ponto: "Banco de talentos é indicação política. Só colocaram outro nome".
O fisiologismo vai comendo pelas beiradas. Quanto mais o governo precisar dos políticos para aprovar projetos polêmicos no Congresso, tanto mais sua própria base parlamentar exigirá benesses.
E o quadro fatídico da semana ainda se agravou com novas revelações do laranjal do PSL contra o ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio.
Em entrevista à "Folha de S.Paulo", uma ex-candidata a deputada estadual pelo PSL afirmou que o ministro sabia do esquema de lavagem de dinheiro do partido em seu estado. Ele era o presidente estadual da sigla. Cleuzenir Barbosa apontou dois assessores de Álvaro Antônio que teriam feito pressão para que ela devolvesse R$ 50 mil dos R$ 60 mil recebidos do fundo eleitoral.
A semana de cão se completa com a revelação da Folha e da Revista IstoÉ de que o filho mais novo e mais bem-sucedido de Bolsonaro, o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) tinha como assessora de alta confiança até o ano passado a irmã de um dos chefes de milícia do Rio de Janeiro.
Todas essas denúncias e dificuldades enfraquecem o presidente e jogam cada vez mais no colo da velha política. O Bolsonaro que prometeu acabar com o velho esquema vê-se agora impelido a buscar o toma lá dá cá da política como solução para sua própria sobrevivência.
Tudo considerado, só nos resta torcer para que a situação na fronteira com a Venezuela não se torne, digamos, explosiva.
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