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Bolsonaro priorizou os costumes. Só faltou tratar de briga de galo

Tales Faria

10/04/2019 04h00

"O que temos de fazer é persistir na luta pela restauração cultural, deixando que a política miúda vá para onde quiser", pontificou no Twitter, no último dia 7, o papa do bolsonarismo, Olavo de Carvalho.

A lição está sendo seguida à risca pelo discípulo e presidente da República. Nesses primeiros 100 dias de governo, Jair Bolsonaro priorizou a restauração de costumes.

A política –velha ou nova, miúda ou grandiosa– foi deixada nas mãos do Congresso. A economia, com o ministro "Posto Ipiranga", Paulo Guedes. A gestão, o dia a dia do governo, ficou com os militares naquilo que não tangencie a restauração de costumes.

Disso cuidam os bolsonaristas de raiz e os filhos de Bolsonaro, sob a batuta de Olavo de Carvalho.

Em tempo: restaurar, segundo os dicionários, significa reparar, restabelecer, reintegrar ou pôr no estado primitivo. Algo como voltar-se para trás.

Não por acaso, durante o Carnaval, o presidente da República procurou uma forma de criticar com ênfase o que considera uma excessiva sexualização dos festejos de Momo. Postou no twitter a foto de uma exibição pública de banho de xixi, chamada golden shower.

O banho de xixi tomou uma dimensão nesses primeiros 100 dias tão grande ou maior do que alguns problemas reais. Como, por exemplo, os que resultaram nas demissões dos ministros da Educação, Ricardo Vélez Rodríguez,  e da Secretaria Geral da Presidência, Gustavo Bebiano,

Bolsonaro dedicou a maior parte de seu tempo ao twitter, aos faits divers e aos lives das quintas-feiras com anúncios como o da demissão da presidente da Embratur por promover um jantar com apresentação do desafeto Alceu Valença.

O presidente gosta mesmo é desse tipo de atividade. Nesses primeiros dias de governo, cuidou de:

  • assinar o decreto que facilitou a posse de armas pelos cidadãos comuns;
  • Terminar com o horário de verão;
  • inaugurar colégios militares pelo país;
  • suspender a instalação de pardais nas rodovias;
  • polemizar sobre a transferência da Embaixada em Israel para Jerusalém;
  • ameaçar com uma aliança com os EUA para ações violentas contra o venezuelando Nicolás Maduro;
  • determinar a retomada das comemorações do golpe de 1964 (esvaziadas pelos próprios militares);
  • declarar que o nazismo é de esquerda;
  • homenagear o guru Olavo de Carvalho durante visita aos EUA;
  • instituir um novo modelo de carteira de motorista;
  • mudar a capa dos passaportes, tirando a menção ao Mercosul.

Enfim, só falta tratar de briga de galos. Quem sabe legalizando as rinhas proibidas pelo ex-presidente Jânio Quadros?

Veio da ministra da Mulher, Damares Alves, a melhor explicação para o que Bolsonaro quer de fato fazer do seu governo. Logo que tomou posse, Damares anunciou:

"A nova era começou. Agora menino veste azul e menina veste rosa."

Como dizem na delegacia: "Aos costumes!"

 

 

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Sobre o autor

Tales Faria largou o curso de física para se formar em jornalismo pela UFRJ em 1983. Foi vice-presidente, publisher, editor, colunista e repórter de alguns dos mais importantes veículos de comunicação do país. Desde 1991 cobre os bastidores do poder em Brasília. É coautor do livro vencedor do Prêmio Jabuti 1993 na categoria Reportagem, “Todos os Sócios do Presidente”, sobre o processo de impeachment de Fernando Collor de Mello. Participou, na Folha de S.Paulo, da equipe que em 1986 revelou o Buraco de Serra do Cachimbo, planejado pela ditadura militar para testes nucleares.

Sobre o blog

Os bastidores da política pela ótica de quem interessa: o cidadão que paga impostos e não quer ser manipulado pelos poderosos. Investigações e análises com fatos concretos, independência e sem preconceitos.


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