'Bolsonaro paz e amor' trabalha para amansar o STF e o Congresso
A derrubada pela Câmara do decreto presidencial de ampliação do sigilo de dados, na semana passada, surtiu o efeito desejado pelos políticos sobre o presidente da República.
O Jair Bolsonaro que entrou e saiu da campanha dizendo que não negociaria com partidos e seria duro com a velha cúpula do Judiciário não existe mais.
Bolsonaro já cedeu ao Congresso nos pedidos de indicação de políticos para cargos públicos e está acenando com recuos no projeto de reforma da Previdência.
Em relação ao Judiciário, transformou o limão de uma crise entre a Receita Federal e o Supremo Tribunal Federal na limonada de uma abertura do canal de diálogo com dois dos mais influentes ministros da Corte: Gilmar Mendes e o presidente do STF, Dias Toffoli.
Ambos tiveram vazados procedimentos de análise fiscal preliminar da Receita que poderiam gerar investigações sobre seus bens e de familiares.
Um relatório vazado, segundo o jornal "O Estado de S.Paulo", levanta suspeitas sobre a sociedade que o presidente do Supremo manteve até 2017 com sua mulher, Roberta Maria Rangel, no escritório de advocacia Toffoli & Rangel Associados. E aponta "possíveis fraudes de corrupção, lavagem de dinheiro, ocultação de patrimônio ou tráfico de influência" de Gilmar Mendes e sua mulher, Guiomar Mendes.
Bolsonaro cobrou explicações detalhadas da Receita Federal. falou com o próprio Gilmar Mendes na terça-feira (26), em telefonema intermediado pelo Secretário da Receita, Marcos Cintra. Desculpou-se em nome do governo pelo ocorrido e, segundo apurou o UOL, pediu sugestões ao ministro para solucionar a crise.
Ontem mesmo a Receita soltou nota (leia aqui a íntegra) informando que pediu "abertura de inquérito policial para investigar se houve crime de violação de sigilo funcional (art. 325 do Código Penal)" e "o indiciamento dos agentes públicos ou privados envolvidos na divulgação de informações protegidas por sigilo".
Segundo a nota, "especificamente em relação aos casos divulgados na imprensa, (…) foram objeto de análise técnica e impessoal e a conclusão dos auditores-fiscais é de que os indícios originalmente apontados não se confirmaram, razão pela qual os procedimentos de fiscalização não foram instaurados".
Pronto, o limão virou limonada. A relação do atual governo com os STF, especialmente com Toffoli e Gilmar, não era nada boa. Agora, a crise fez abrir um canal de boa vontade.
O mesmo espírito de "paz e amor" está sendo empregado na relação com o Congresso, depois da derrubada do decreto presidencial de ampliação do sigilo de dados.
A começar pelo próprio decreto. Os líderes do governo conseguiram retardar o envio ao Senado da decisão da Câmara e, enquanto, Bolsonaro decidiu revogar o texto que havia sido assinado pelo seu ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, e pelo vice-presidente Hamilton Mourão enquanto ele estava em Davos (Suiça).
O presidente também anunciou a criação de um "banco de talentos" que, na verdade será uma lista de indicações feitas pelos parlamentares para nomeações de cargos comissionados no governo.
Bolsonaro nomeou sete vice-líderes do governo na Câmara e uma líder no Congresso, Joice Hasselman. Ouviu que dois pontos do texto da Previdência não são aceitos pelos potenciais aliados: o que trata do Benefício de Prestação Continuada (BPC) e o da aposentadoria rural. Sinalizou que está disposto a ceder nestes assuntos.
O presidente também já se encontrou com líderes de partidos próximos ao Planalto, mas ainda não formalmente aliados, e as bancadas do PR, do PSD e do PSL.
Hoje, seu ministro da economia, Paulo Guedes, se encontrará com os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), para apresentar uma prévia do projeto de Previdência dos militares, que será enviado ao Congresso. E ouvir quais pontos do projeto de reforma constitucional da Previdência devem ser mudados para tornar mais fácil a aprovação.
Guedes está instruído e disposto a combinar uma estratégia de recuos graduais, cedendo ao máximo pela aprovação daquilo que o mercado considerar fundamental para a retomada do crescimento econômico.
Bolsonaro se espelha em dois ícones da esquerda. Em Che Guevara, mostrando-se duro "pero sin perder la ternura", e no "Lulinha paz e amor" das campanhas eleitorais em que o PT saiu vitorioso.
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